a verdade morava dentro duma caixa de sapatos cor de rosa
tinha olhos vesgos era sem pescoço
e se escondia da vergonha esquartejada
a vergonha sempre foi uma socialite histérica
que entendia a verdade como uma prostituta vertiginosa
e o silêncio
o silêncio era tudo
cena 1:
nossa prostituta verdade caminha pelas ruas
como se estivesse bêbada de esperança a qualquer preço e fala:
minha razão tropeçou naquilo que me faltava
alimentei toda moral confiante na certeza dos abutres
agora sofro por ter me enforcado no cipó da lógica
ando morta rabiscando meus desejos nas muralhas suicidas
prefiro hoje o monstruoso silêncio
a safada socialite vergonha
tomando um porre no boteco da esquina
mais uma vez se camufla se cobre com uma burca
cena 2:
ambas se encontram no mesmo cabaré todo-sonho-é-titica
verdade resmunga:
vergonha sou vertiginosa e vagabunda
me transformo em mentira toda hora
acho que tudo vestiu a mesma roupa
minha voz antecipou delírio
enquanto verdade se lamenta:
uma bicicleta vermelha atropela um poste
uma criança chora comendo banana
um mendigo pensa em assassinar a lua
vergonha agora tagarela:
estou cansada
cansada de mim e destes terapeutas que me amolam
não me escondo me estrago ouviram
sou de silêncio um gozo
de sombra nas crateras do infinito uma fuga
:um tomate gigante rola pelado no palco
uma dentadura fosforescente canta
verdade e vergonha se olham provocativas
e se lambuzam de jóias
cena 3:
nove homens verdes fazem arruaça no palco e desaparecem
verdade come a língua
vergonha esfaqueia fumaça com fúria
começa uma ventania
verdade se joga no chão
vergonha se mata na cortina
stravinsky toca
a platéia continua surda
e o silêncio
o silêncio virou grito
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