domingo, 30 de março de 2014

a droga da esperança e o credo

vila rica - coração continua sendo vilão deste desejo
não consigo explicar -
a partir de agora sou esta tarde vazia num canto
gosto nojento de cevada em minha boca
trago a alegria dos alicates que atacam o osso
sempre a mesma porra barroca à regurgitar memória
falta tranquilidade para o trapezista atingir um sortilégio iluminado
peço tuas mãos sonâmbulas e enfermas pra compor este instante
drama com cheiro de sangue na senzala das pedras que me atolam
abraço tuas ladeiras e cuspo no ventre de tua riqueza duvidosa
estarei cego pra tudo que não for espontâneo
não tem preço as entranhas do afago
quero a doçura desta agressividade gulosa
liberdade litorânea daquela besta
nada se aproveita
anseio morte onde as palavras me embriaguem feito um deus no cativeiro
é o esplendor que se fez trapo
a rua continua fria - perambulo noite inteira
o fantoche de dona olímpia - uma caricatura mal feita -
hoje tem gosto de academia
ele é poeta - foda-se fany - alminha que já não voa
minha liberdade odeia teu teatrinho chulo - arranjado - universiótario
por que sou vida - desnecessário falar que sei suicidar os postes
arremato sem justificar o corpo -
a droga da esperança e o credo

domingo, 23 de março de 2014

reza-morena-que-não-sei-doar-meu-coração- a-medina

a lua saindo do meio do mato
rua grande - pico do itamaraju
nascia peito na indiazinha da boca bonita
olhos corporificam o barulho - a natureza do chão
posso até sentir o gosto
mais uma vez esta alegria ingênua brinca e mostra as pernas
o espasmo dos deuses persiste - não consigo alcançar o romance
como se doasse ao destino outra crença -
deste desejo - tenho a incapacidade de ser vazante
escarro improvável de escrita - na dolência da carne - a mesma coisa
este esquema à transbordar o vício - adoeceu o monstro -

como se falasse:
deus-é-mais - deu-zé-mais
fica sem fôlego o sacerdote
já não me interesso pela maresia das horas
o encantamento desta pureza é uma farsa
mucugê do artifício
a fraqueza daquela noite passou a ritmar o grito -
o grilo da menor espécie
amanheço de cara amarrotada neste terreiro
aqui se compra escombros de paixões triviais
arraial sem rudimentos de luz
triagem de quem sobreviveu ao câncer
sentinela de lençóis anêmicos - cisco a dor dum ritual ridículo
pus de ousadia órfão - solidão atrevida rasurou a paz
as cores do acaso

também sei contar história:
traz uma galeria de imagens no crânio
heroína da fábula nem se justifica o turbante
pois o turismo veio denegrir a virtude
a musculatura desta terra
reza-morena-que-não-sei-doar-meu coração-a-medina
simpatia folclórica - a princípio vou registrar tudo
o passado deste canto - a vilania deste vilarejo
ouço a lama de toda mitologia
ministério oriundo das desigualdades
distribuo os tesouros que me faltam aos assentamentos do todo
é certo que a arte dos encontros sempre foi uma mentira
não procuro casa - estou sozinho neste quarto de almas longínquas
é o incêndio das ninfas - coxa de menina na bicicleta

sabe nossa senhora d´ajuda -
o final só seria esplêndido se estas pedras urrassem -
se a ilusão deste credo não estuprasse a verborragia primitiva do sangue
foram estes beatos que acordaram as árvores -
que trouxeram a doença sacrificando seu aprendizado
gulosos de tanta cegueira - são adoradores da culpa -
do falso perdão que se incorpora no firmamento
se reproduzem como se nada houvesse acontecido
outrora perdeu-se o potencial de musgo -
quando vossa senhoria arreganhou os dentes
na catequese da memória - já nem sabe mais cantar ciranda
que meus orixás destruam a lepra desta catarse -
sem o sincretismo besta de seu medo -
indígenas indigentes agora clamam -
ódio por todo delírio coletivo - plural
o invisível possui seus direitos e nunca precisou de passaporte
só esta hecatombe fortalece sua calamidade alegórica
seu faz-de-conta -
todavia seu duvidoso bronze praiano - esfrangalha o espírito

sábado, 22 de março de 2014

vento que se sente e não se vê

sinto-me lodo
quando pelo óbvio respondo
consinto
imaginação vira um vazio - atrapalha a realeza do sonho

avisa que o corpo - essa carranca que habito
precisa novamente encontrar sua sinfonia

pois desaprendi a andar de muleta
perdi o jeito

e pelo caminho - pensei na dor das araras e das arestas

parece poesia a mais pura vertiginosa falta
amor que já não encontra asilo

quero a liberdade das formigas
o catarro das seringueiras

no vigor dum novo grito
porta que não bate em minha cara
outra ordem

só quem consegue amar o inútil
se reconhece neste reflexo

é você capaz de amar o inútil
os escombros da língua

amor - dor sisuda que não tem alento
aqui afagos de inércia

nem sombra - nem água fresca
apenas chão árido
rachaduras de alma à sentenciar beleza

por que sou do inútil
aquele sentimento que os demais rejeitam

isso nunca foi poema
é grunhido de farpas
misericórdia dum amor na caatinga do instinto
que nem se importa com a chuva - tampouco com a tempestade

todo oferenda
esse amor odeia lógica - certeza
e só se refresca
                       vento que se sente e não se vê

quinta-feira, 13 de março de 2014

medo que dor regurgite o trapo

deixa te contar uma coisa:
aqui é tanto umbigo que nem se reconhece o tango
não temos botika fazendo performance no cativeiro
tampouco herança hereditária de papai feliz
sonhei que desistiria do bardo que me habita
cadeira pra mim não serve só pra sentar a bunda
entendeu
meu comparsa ainda na bolívia se imagina
me vê dois cigarros
este fica pra fuzilar a noite
este fica pra fuzilar a ordem
defender a tese do sarro
as ranhuras do permanente
como se as coisas ali gritassem
cães e cavalos eram o público - o desastre chegaria logo
porque não falar deste naufrágio
dos estudos de alice
vinte mil carrapatos de zarvos
esboços duma inspiração sórdida que já não acredito
pois o outro fabulava trejeitos na película
experimentei esta sede por alguns dias
 fui matéria para os patifes da prole
vai - pergunta -
quem escreve bem no brasil
quantas bestas se vangloriaram com a seiva
palavras perdidas do século dezenove
a resposta nem sempre é convincente pra quem é uma ilha
há no álibi de cada fotografia um defeito
humanidade governada pelo medo
medo das correspondências elétricas
medo de perder o emprego
medo de perder a calcinha
medo da paisagem - da memória
medo que move o mundo
medo que este silêncio sirva de alento
medo que dor regurgite o trapo
todavia posso instigar com gargalhadas a fonte
espero o inesperado
olhos que se afogam na imensidão sem nenhuma estrela
milagrosamente - esta língua - encantou a praxe - acelerou o transe

quinta-feira, 6 de março de 2014

na enciclopédia da falta - singular mérito oco

um preso é bondoso com outro preso - pergunta - girassol ou  gira-noite
irrisório deus - dá um kant -  monstro que bebeu guaraná na paulista sem depois
outra vez corre atrás de boceta
foucault masoquista na arqueologia do ego -
compra um céu metafísico pra cada soldadinho de chumbo
desata o nó que prende o barco - é modinha
só quero o sapato no pé do morto como oferenda
pernilongo que não vai embora
na enciclopédia da falta - singular mérito oco
homem que anda na contramão deste instate
retórica - falcatrua e silêncio
a cerveja no vazio rudimentar da rua -
dentre outras cores - fotografias sujas de lama
vertiginosamente a vida nem carece de alento
reparou - daqui uma hora tudo se repete
alguém fazendo samba na laje - essa mandinga - essa suruba
a priori - beijo com renúncia o dialeto azul de seu distúrbio
querida - vou recontar as estrelas que sobraram na tigela
palavra umbilical da língua - existência
um famigerado desejo - atribuía destino as lágrimas do bufão
outrora um novo faquir excomunga a virtude do peito -
que se fez penumbra longe do gozo
neste sentido sou uma contradição perfeita
a violência da carne - paradoxo sem paz
coloquial  como a cueca do vovô detido
o acrobata italiano namorando na varanda a viuvinha - chora
cristão só para o meu cuspe -
a beleza do sofá queimado - próximo do caminhão de abacaxi - resiste
quando não afagam as pulgas até os carrapatos desaparecem
chego a cheirar o cu desta realidade suicída
risonho pela liberdade de quem vê a lua
descreveu ruínas de memória
como se a dor de um povo - seu sangue - fosse documentário
abandona chuva - incendeia coisas que amo  
pois no coração das rãs naufragou-se o vento
eu de terno e sem ternura admirando o brejo - serei outro
espero severino feito um cão banguela de rimbaud
no açaizeiro sem moléstia - chama cupim de santo
na mídia ou na média e não derrapa