quarta-feira, 27 de maio de 2015

silábico silêncio de toda sina

arriscou garatuja na parede da sala
vizinhança o que não compreendia apelidava de loucura
só sua mãe admirava com interesse o escrevinhar da filha
tempo ali corria mais que bola molhada em campinho de terra
huína de há muito rabiscou casa inteirinha
metáforas eram incêndios nos nascedouros de sua língua
devaneios de sombra que escandalizavam a razão dos homens
povo desconhecia por completo este povoado vazio
mas ela continuava manuscrevendo inabalável seus impulsos
dizia expurgar os fantasmas do crânio
e que as paredes de casa eram páginas vivas de seu livro concreto
sua luxúria - sua fome - seu gole d'água de cada dia
huína botava infinito nos desarranjos da cor
fotografando a noite em seu canto sútil
traduzia em plenitude os rupestres dialetos d'alma
beleza que ninguém mais vê
pois sua voz onírica iluminava toda alvenaria
selva de palavras no murmúrio do vento
silábico silêncio de toda sina

quinta-feira, 21 de maio de 2015

ombridade do karma - zoinho

sei que zoinho fazia pão madrugada inteirinha
pra que aquela gente bem nutrida e feliz comesse de manhã cedo
duas da madruga na viela do buraco do tatu
esperava seu primeiro balaio eram mais dois atém o centro
ia cochilando em banco duro quando não fazia em pé toda viagem
na maloca só comia pipoca de panela o padeiro de grana curta
naquele sábado ouviu blá-blá-blá de mentira
que o dinheiro furtado da petrobrás tinha sido devolvido
deu risada por que aquilo não tinha ressonância alguma em sua vida
enquanto um bocado de professores por ali tomavam pancada da polícia
outros desistiam da escola à favor do instinto
passar fome para alguns tinha bem mais nobreza
que dar o cu para o estado
todavia
quantos PT'S haveríamos de suportar
de superar o colapso global na língua do papa
voltemos à zoinho
com seus 25 anos
segundo grau incompleto
pai de família e algumas rugas na cara
desacreditado de tudo
burro de carga
futebol na televisão e outras anestesias
ele que já pensou em suicídio
em se deixar mendigo
virar bicho do mato
encarava a porra daquela jornada por causa de suas duas filhas
sabia que a merda consistia em se importar com o próximo
e não amar o distante
fazia uns nove anos que ele pagava aquele aluguel criminoso
pelo barracão sem janela e que sempre pintava uns da defesa civil
em época de chuva pra encher o saco
que só comprava o grosso no supermercado da máfia
e que ana eliza sua filha mais velha saiu de casa e virou prostituta
tempo foi passando ...
e zoinho abandonou toda aquela bosta
caiu na bebedeira
nunca mais consertou a torneira da pia
espancava maria
trepava com lia
e vivia catando as sobras de todo chiqueiro
neste brasil barril de pólvora
seu antônio seu pai dizia
que se o caboclo num vira crente
que de bandido pra bebum todo bando faz carreira
esse velho morreu de febre achando que recebia de jesus o transe
foi um vagabundo fodido que se sentia iluminado
mas não era hereditário aquilo de bíblia em seu filho
moral fajuta
sermão de rua
isso não
zoinho carregaria com ombridade seu karma
enquanto as demais bestas diziam que a vida era feita de escolhas
de que um pega estrada e o outro carona
a biografia de um homem e seu legado de dor
continua sendo o esquecimento
página em branco
história mal contada pelos que venceram satirizando os que fracassaram
nenhuma vítima de bala perdida
seja lá tiro de doze
fuzil a.r 15
oitão receberá seu quinhão
fantoche humano na mão do sistema tem aos montes
e se falta cultura pra cuspir na cara da estrutura
meu doce raul digo mais
amai estes erros com toda sapiência de nossa ignorância
enfado que advém de buscar em tudo sentido
de há muito zoinho não segue cartilha
sabe que favela hoje anda sendo glamourizada pela novela
balela
compreender a vida amontoada de vícios
achando que deus faz milagre e traz virtude
o grude
de toda paz comprada bate de frente com esta guerrilha quotidiana
sem que possa esperar dias melhores
quantas mortes seu vivo cadáver aguenta
quantos paraísos artificiais há em seus infernos astrais
ainda bem que tu não deu conta do recado
que não caiu na mesma armadilha chula de igreja que nem o trouxa de seu pai
tu foi mais homem
mesmo se machucando em tudo
conseguistes dar cabo ao fim
muito antes de raiar o sol naquela periferia ...

boquinha d'oro

existia uma certa tranquilidade que já não se vê
aqui mesmo neste cabaret
puta tinha classe
tu não viveu a coisa mocinha
a gente possuía uma elegância discreta
nem era vulgar
que nem esse bando de cachorra piranhada boca-suja
outra história
naquele tempo o boquita d'oro
era só frequentado pela nata da nata
tinha qualhada não
toda noite lulu-pérola-sereia era quem dava o show
havia orgulho nos olhos de toda vedete
magia arte me entende
a mim remanescente desta época
paris era este salãozinho encarnado aqui no subúrbio do rio de janeiro
poxa vida que saudade maluca sinto
sou nostálgica não viu
mas ta vendo este brilhantezinho em meu dedo
foi presente dum francês ilustre que não posso dizer o nome
este sofazinho escarlate que tu botou a bunda
também já viveu seus tempos de gloria
quantos poetas romancistas escultores
nele sentaram fumando haxixe e bebendo vinho tinto
existia glamour em cada objeto
em cada gesto
até a melodia que saia deste gramofone era mais bonita
falo de beleza
coisa que hoje muito pouca gente entende
tudo anda tao ordinário medíocre
sem prestígio
pois ignorância parece que tomou conta de tudo
o mundo virou um grande atacado
cheio de porcaria no varejo
vagabundo hoje aqui entra da calote
e lhe digo mais filhinha
as putana de agora gostam de homem sem brio seboso
te conto uma coisa
puta boa tinha mesmo era que guardar a alma na geladeira
teve uma aqui
que se apaixonou por pé-rapado
pegou barriga foi embora
depois voltou pra vida com filho no colo e foi assassinada na rua
isso nunca deu certo
corpo de mulher acaba
envelhece mais que homem
tu ja viu
as estrias aparecem
peito murcha
o cabelo branquece
os cristais dos olhos perdem a cor
morrem os trejeitos de menina
duma sacanagem essa porra de vida
desculpa o palavrão
acho que fiquei escrota
que nem esse povão doente
ai ai
puta inteligente
nem ressaca tem com bebedeira
esperta
sabe gastar seu batom
e só beija quem tem gosto
puta nem sonha com príncipe encantado
tudo sapo
mas girino tem que ter grana mesmo
mulher de verdade não acredita em promessa de homem
quando puta vira patroa
sempre fica uma magoazinha de homem que tirou ela da boca do lixo
pois o amor sempre foi um diabinho que adora foder o cu de cada anjinho
minha querida o papo ta bom
mas descansa
tu ta novinha só no frescor
vai pro quarto
se prepara pra tua estreia
capricha no decote
me deixa agora sozinha
perto deste piano sonhando
a cafetina aqui filhinha já teve a cinturinha gostosa que nem a tua
não era essa porca derrotada pela vida
vai logo meu amor
perfuma a carne
adorna o rosto
bota fita colorida no cabelo
hoje tu vai ser deslumbrante hipnótica
mas aprende logo a ser indiferente que finge quentura
que essa nossa conversa lhe traga bons agouros
ta ouvindo essa musica
eta que nostalgia besta
deixa eu fumar um cigarro
dar uma baforada na saudade
pra ver se sara
pra ver se todo amor me esquece ...

a familiar fofoca dos fungos

saudade de tão sintomática
pode ate virar patologia
estou escrevendo
em noite chuvosa pelo litoral da bahia
minha filha dorme
repousa na cama ao lado
meus olhos ardem
com o brilho da tela que não acentua nenhuma palavra
existir nao carece de literatura
quando primitiva a vida
nada pragmatica
transborda ...
o silencio glorifica
sem atestado de conduta
o sonho
infante
sem pensar nas agruras
presenteia-me
amor
o impossivel
nenhum deles estavam certos
tartaruga nao sabe fazer curva
arara tampouco gosta de antena
ha ventos que aliviam o peso
o velajar da jangada
a solidao de um marujo
supostamente enganado
todavia rimbaud seria ridiculo
se no aquario da historia continuasse
artaud jamais desfilaria com lagostas amarradas numa corrente
feito nerval pelas ruas de paris
sua crueldade era outra
personagem
a margem
contraditoria
o mito
mente
poucos escutam o oxigenio da mata
descascar uma laranja
armar uma ratoeira
esperando a fome do rato
outrora foi poesia nos para-raios do peito
caixad'agua no diluvio da prosa
imagino
a matematica dos mouros
um exilio espontaneo
a familiar fofoca dos fungos
a ilusao plural dos fatos
a fanfarra singular dos laudos
temos novas fotografias
por que vou sair pelos fundos
feito funcionario duma industria falida
que não se importa com minha sensibilidade
sei ignorar a missa
o porvir
as cores que voltam
doar meu sangue
para os despropósitos da fauna

vó conjunta

qualquer chuvadinha vó conjunta
corria pra dentro da choupana trancava tudo e ficava quieta
desde menina tinha medo das torrente d'agua que descia do ceu
igual sua mae ela se encolhia
e rezava pra sao pedro ficar calminho
botava sabao na pedra com desenho de sol pra ver se temporal dava tregua
a tosse braba daquele ceu
povo ali chamava de relampago
conjunta nao tinha lingua pra dizer tal palavra
pra ela era deus botando o dedo na garganta enjoado
vomitando sobre a gente sua canseira
tinha tanto pavor que em dia chuvoso nao benzia
se guardava junto da lamparina
fogao de lenha acesso
e miudo seu caozinho por debaixo da cadeira
nem cafe forte tranquilizava aquele susto
cachimbo so fazia esquecer um grao
da janela ouvia a corrida da enxurrada descendo a serra invadindo a rua
querendo machucar a horta
o vento vertiginoso na copa das arvores tirava de vez sua paz
hoje vo conjunta esqueceu roupa de encomenda la fora
ajoelhou pro santo pediu coragem
pra abrir a porta e nem conseguiu
lembrou sem porque
se deus finge de surdo
o capeta escuta toda predica
achava aquilo tudo blasfemia
mas se o santo manca
o diabo serve de muleta
vo conjunta abriu a porta
tocou um foda-se como gostavam de dizer seus netinhos adolescentes
escondeu seu medo na cachola e pulou no terreiro pra apanhar rouparia
em suas acontecencias
a trovoada ensaiou outra vez a melodia
vo conjunta
escorregou na lama e nao caiu
agarrou vigorosa os pano
com jesus exu-tranca-rua
menino angola virgem maria no peito
e conseguiu realizar o feito
quando voltou pro aconchego de sua mansarda e novamente trancou a porta pediu perdao
rezou umas trinta ave-maria
mas a vela tinha que queimar
pro diabo pela promessa noite inteirinha
o sagrado e o profano naquele instante pra vo conjunta era a mesma coisa
o pleno acaso de sua prece

terça-feira, 19 de maio de 2015

um blinde ao ego universal deste gozo

sim - trepei - vez enquando ainda trepo com estes defuntos:
jorge de lima - mario de andrade - campos de carvalho - henry miller -
blake - bukowski - celine - cioran - rimbaud - artaud - huidobro -
hilst - nerval - lautreamont e ate com o fantasma de mim mesmo
um blinde ao ego universal deste gozo
so que na real tiro vida das pedras
dos empregos vagabundos que arranjei
no olhar dos caes vira-latas que cruzam meu caminho
por que em cada rosto sofrido que a mim se apresenta
encontro algo latejante como se fosse uma vertiginosa verdade virulenta
nunca sei ao certo o que devo fazer
se atendo o telefone que toca ou se desligo
jamais trago decisoes na ponta da lingua
sou inseguro pra ser livre
caminhei por varios lugares e ate perdi alguns dentes
estive em cuba tendo como cicerone pedro juan gutierres
em sao paulo bebendo vodka com roberto piva
li minhas pregas da boca pra cada poste da augusta
e tomei muita pinga com mendigo nos arcos da lapa
mandei a merda o patua dos editores de toda e qualquer confraria
agora neste meu quarto de despejo
recebo da vida sua homenagem
o beijo doce daquela porrada
o transe tempestuoso de nenhuma nuvem cigana
so esta felicidade clandestina sem os otimistas me encherem o saco
estais compreendendo a escritura literato miope
isso nunca foi comico
guardei a bicicleta dentro do quarto
os livros no plastico e sai sem destino afim de contemplar outra paisagem
concordo perfeitamente com chinaski:
homens que passaram por universidades
são impotentes cavalos que ainda se acham garanhões
prostibulos - hospitais - prissoes
possuem mais poesia do que toda esta vidinha apagada cheia de vicios e monotona
daqui alguns segundos devo divagar uivando feito um lobo selvagem
eu que so quero morar no meio do mato
sem as virtuais asneiras que atrapalham minha alma romântica
essa dica define nada
mas definha se decompoe
feito casca de laranja no meio do barro
entao se queres escrever algo que realmente preste
habite sua solidao feito casa
sem as demais facilidades que oferecem todo condominio fechado
aprenda por tortuosas linhas que atalho tem mais beleza que estrada
que osso de avestruz
nunca foi osso de galinha
deixe rastro no chao
pegadas na caverna de um flutuante futuro
assim meu caro iniciado carregaras toda luminosidade do mar nos olhos
o semblante lascivo do demonio e seu capuz
cantaras como as sereias numa lingua hipnotica que ate albatroz se apaixona
depois deste mergulho chegara um vento misterioso em sua masmorra
trazendo o onírico mapa de sua fortuna imaterial
eis ai a senha cantada pelo sublime príncipe do real segredo
todavia
atabaques de fogo anunciarao
a musicalidade de seus versos
maracas embriagados
o ritmo incessante de sua prosa
voz alargando o oraculo
folhas de relva
no repouso das barbas milenares
devaneios que saciam a sede do bardo
na viagem só me mostram o quanto as pessoas
perderam a capacidade de se aventurar em tudo
despovoadas estao de fantasias
tudo passou a ser uma desculpa
alimentando a inercia
que corre atras do proprio rabo
mal levanta e ja reclama do carcere
sentimentalizando o surto

o princípio primitivo de toda vida que se apaga

casa de seu caramujo era florzinha vermelha de pintinha amarela
suas petalas adoravam ser acariciadas pelo vento
enquanto senhor girassol por ali se bronzeava
seu caramujo foi dar uma voltinha
qualquer movimento
possuia em sua jornada eternidade
cantarolando sem nenhuma pressa
seus olhos viviam encantados
tudo tinha gosto de orvalho docinho
seu caramujo era feito de poesia e amava as manhas de sol
onde esparramava seu ocio
sabia que sublime nao tem tamanho
toda natureza o apetecia
vivia a volupia da fauna e flora
a simplicidade natural daquele reino
quando ceu chorava ele fazia festa
ouvia com intensidade a ciranda dos sapos
contemplava com ternura
as arvorezinhas respirando
o cipo cada vez mais verdinho
e o barulho das aguas
de cachoeirinha ainda forte
tempo foi passando e chorinho do ceu ficando escasso
ate sereno na floresta era pouco
agua um dia abundante
pelos homens da aldeia virou desperdicio
seu caramujo ficou tao triste
mas tao triste que pediu pra sao pedro castigar aquele povo
o que nao adiantava muito
pois a sede dos homens sacrificaria ainda mais o habitat dos bichos
as coisas por ali adoeciam
a terra implorava um beijo de chuva
as cigarras entoavam seu lamento
formiguinhas morriam de fome
feito boi sem pasto
naquele ermo as lagrimas de seu caramujo regavam a ultima flor do mundo
o princípio primitivo de toda vida que se apaga

estandarte de qualquer refúgio

inicia-se o prelúdio
o fazer pleno das afetividades
ao vivenciar minha cria
sua energia dando estrelinhas na grama promovendo a festa do pijama pra as tres amigas
meus olhos se desintoxicam do sangue sujo do seculo
contemplo num olhar infante a alegria deste momento
mesmo sendo esta boa ventura temperamental
aceleramos o passo chupando picole no meio da chuva repetimos aquela ciranda
fortalecendo meus fracassos pra que todo amor seja sublime
feito batata frita com oregano
depois do sonho filha
as coisas nao mudam de postura
o ciclista tem pouca ciclovia na cidade
pirilampo e cigarra virou lenda diante falta d'agua
cresceremos juntos na solidao das horas
aquilo que vemos nem sempre enxerga com compreensao o que diminui
persigo o gozo imprecindivel de qualquer imagem
o vendedor de algodao doce
esta garoa fria que cai em sao paulo
uma existencia que arrisca
vale o vigor do trapezista
a lona rasgada do circo
minhas retinas invadiam aquele buraco
espreitando por entre as pernas de arquibancada todo teatro
ainda hoje a musica continua impregnada em meus ouvidos
pois rua todo pivete sabe que jamais sera pragmatica
por ti ananda
carne de minha carne
filha minha
meu sorriso cansado junto ao oasis de sua infancia vai embora
e o lirismo das inventivas brincadeiras acontece
tu sabes melhor que qualquer poeta dissecar a palavra
construir na areia da praia uma forte
botar papai pra acordar cedo sem ressaca
abrindo a janela do quarto pra que o sol aplume
sei que sua falta de disciplina deseja nao ser domesticada
que toda escola retalha nossos instintos
aprendo contigo o quanto necessário
viver na vertigem de cada desenho seu impulso
menina que me pergunta tudo
na falange do nada
as nuvens se multiplicam e nao se encontra resposta
o brigadeiro fica ainda mais gostoso
seja na tristeza ou na risada
a caminho do vento
o arco-iris parece um escorregador
as cores te falam
tocante sao os gestos
crânio alento e templo
o para-casa do sapinho azul
a algazarra da vovó formiga
mais refrigerante nos finais de semana era uma festa
em seu agouro
estandarte de qualquer refúgio

pela voracidade cênica do corpo

o que representa a morte de um ator para um povo que nunca vai ao teatro
mas que atua no mesmo cenario
lutando pelo suado pao de cada dia
quanto vale o espetaculo derradeiro
de nossas vidas neste picadeiro
na verdade este homem provocava quem
quantos desempregados
pseudo-intelectualizados o assistiam
com quantas dinamites se constroi um verso
uma palavra que transceda qualquer discurso melhor que canoa
nenhum gemido grego
pode hoje abafar o vazio
na real pra que serve um programa de TV
deixar algum legado pra esta estapafurdia contemporaneidade compensa
conheci abu na zona oeste do rio
com seus suspensorios numa padaria
estava eu naqueles dias peregrinos
fazendo a via-sacra de vender meus folhetins em todo canto
trocamos olhares
destilamos nosso veneno
em poucas palavras
nos despedimos com um beijo no rosto
ele ficou com meu livro
lendo-me em bom som ali mesmo
aquele dragao carrancudo de voz rouca
cuspia fogo em sua propria sombra
andava cansado
porem sempre apaixonado pelas medeias do cordume
retinha vida nos olhos intoxicados de ubu-rei
diante tudo que perdia o gosto
abu só professava fé em criaturas que faziam curva em poemas que erram
no entanto de olhos cegos
meu paladar
nao quer distinguir o orgasmo da fruta
melhor morrer sem as fronteiras do fluxo
divagando sem pensar em porvir
pela voracidade cenica do corpo
a tarde continua tisica
a noite tem unhas encravadas
e chora na farmacia
voluptuosas vazantes
dirao ao tempo
que ele nao possui significado
vais para um lugar mais pleno
leva teus vaticinios
tua arte incomparavel que um dia
com o dinheiro da rede globo
alimentou teu figado
digo que o teatro anda orfao de ha muito
nenhum porre de arak pode iluminar
o cranio deste cavernoso silencio
nenhum plinio marcos nascera de novo
baba-ovo algum
conseguira reproduzir o folego
almas de sangue
os latifundiarios do espirito
botaram redeas em toda liberdade
qualquer especie de risco sem nenhuma vantagem agora rotulam de loucura
tens que ficar calado
politicamente igual a toda pastelaria
fritar o peixe na mesma frigideira
sem reclamar da pia
isso nao
o sorriso banguela de qualquer vagabundo tem mais vida
meu instinto nao consegue engolir a cidade
paraisos artificiais nao me servem pra nada
o teatro foi de vanguarda
a vaidade de segunda
por que toda realidade rustica
pede outra carne

o sangue gemia em chicote parado - circo na confusão da memória

os camponeses ali so falavam a lingua selvagem do vento / bebiam de agua cristalina / desorganizando o criterio da fome / abutre atormentava o rabo do cao / aquele ceu jamais seria puro como o nectar universal do proximo desenho / vozes fantasmagoricas assombravam o casarao solitario
cheio de ervas daninhas em seu subsolo o sangue gemia em chicote parado
o ultimo escravo recebeu alforria para os dedos / os demais potros enjaulados perdiam misterio / silencio que anseia invadir aurora / apenas um filminho de sacanagem pra lembrar que ainda vivo neste palavrorio
ninguem vasculhou virtude
um foguete russo vai cair sobre a terra
o apocalipse de minha mentira
tem mais verdade que toda moral social
na desordem subjetiva das coisas esquecidas levou-se tempo para reconstruir o trono
trovas triviais nao me interessam contemplemos o cacarejo
pela costa rudimentar / a noite
fascina-me / ceu forte / fortificai minha fome / a nostalgia do lapis / garatuja o veneno do xarope / eis a missao ingovernavel de toda carne natural e vasta / agora os atributos da tribo serao outros / pois os demais homens nasciam da morte / conas carnivoras martirizavam suas crias
meia duzia insiste em possuir bandeira
in absoluto
ter um nome nao traduz nada
esta nevoa agramatizou meu sangue
estuprou o destino do corpo
lantejoulas de uma razao ficticia
posso iluminar este fosso
nunca o medo conduzira o verso
a mao do amor dizia minha filha
veio de chuva escorrendo na janela de vidro do carro / feito afegao sentado nos escombros que choram / ficou exotico glorificar a dor de um paria / partiria no trem pra outra cidade de espirito profano
camundongos na filantropia da faca
a pedagoga de murmurios lunaticos exalta a catarse do cacto
deserto de obras / cisco no umbigo da rua / circo na confusao da memoria
encontrei a lamparina e o caderno
os mercandilistas apocrifos
outrora pretendo derrubar os idolos de minha propria iconoclastia
junto aos tarahumaras
celebro o sol em seu esplendor negro

encerro minha conta pela cota de textos em toda página

trinta e sete primaveras árabes talvez
de alguns raros outonos
e multiplos invernos infernais vivi
pois nesta hora a cuca transborda
deixando a desejar o parto
todo fascínio desaparece
vai embora
na bagagem
leva só os devaneios da falta
arranjos sem tecnologia alguma
nascedouros de luz que se afogam no escuro das nuances
todo aniversário gregoriano tem seu martírio
só me perguntem o quanto uma borboleta goza em sombra de orvalho
romantismo que ja nao enxerga aquilo que respira
o táxi da ilusão ali faz ponto
verborragica fuga
encerro minha conta
pela cota de textos em toda pagina
e adentro a liberdade prolifica dos pelicanos
o duvidoso amor deste orgasmo
anseio agouros de um sentenciado sentido
caminhao que derrapa na curva
a familia de meus transbordamentos nao tem linhagem
duas filhas temperamentais e um verso
pela quantidade substancial do vicio
onde o personagem fotografa
o vazio surreal da plenitude
a paz feito faca de dois gumes
traz em si muito lodo
minhas sequelas nao se transformarao em livros de bolso
de silencio se aproveita alguns proverbios
te quero rimbaud
peregrino na costa do marfim
seu nome se apresenta inabalavel
em minha memoria
olha
a catarse do ego nao adianta
ha gafanhotos que devoram a partitura
trapezios de vento no espetaculo da rua
contemos uma nova historia escandalizando o karma e a rotina
escarceu de lua
iluminai o oceano
o transito das bicicletas
arma que dispara em peito oco
desdenha angustia
desastre na revoada das cinzas
disse que daria um basta
a coisa abocanha meu tempo
precisa urgentemente levar um coice
posso ate editar as incertezas
por que gosto do cheiro
mas detesto o gosto
a ficticia solidao dos fracos espalhados pela estante ja nao me apetece
embriago-me de outros resquicios
a vida conflituosa da cidade
um tratado de arnica
parkson de canela
tudo pela avalanche da perda
musgo sem o otimismo das paredes
a saude sismica daquela voz abomina seu herdeiro
entretanto meu folego
na valsa dos bichos
alimentou aquarela
pergunto
como devo mutilar as pernas do capital
incendiar o poeta que nao vive sua poesia
a sapiencia do monge que fuma
cego de natureza
a nuvem interrompeu sua verve
terno de criptonita nos tropicos por uma bagatela
adoeci barroco
junto aos talheres da casa
fragmentou-se toda causa
sem a moral da música e da prosa