dela só se sabia que lavava
as madeixas em água de chuva
o resto seria incógnita - meio
a tanta cegueira
tinha olhos tenros - um semblante
franco - rasgado - que até soa fictício
porém seu silêncio decompõe qualquer
futuro
ela que nunca reclamou da
falta - sonho era seu chão
nas vísceras da cidade - em
qualquer esquina repousaria o corpo
nela os vira-latas se
reconheciam - repartiam os pães do segredo
sua solidão avacalhou matéria
pelo canto
contemplar esta sombra
afogaria o trânsito
os demais transeuntes se afastariam
pois o ponteiro da razão na
cabeça do ego pra estes é tudo
os mesmos dizem que singular não
presta
que a vantagem está no que se
consome
que o status da varanda é ter
cortina
digo que não me interesso
pela epopéia racional do mundo
por seus automóveis sujos de
sangue nem carnificina
que já não sei falar das manhãs
feito um jogador de futebol
trago em mim a sede de um
outro reflexo
insisto - na ternura sagaz do
lobo que me habita
coisa que só eu vejo nos mínimos
detalhes:
bando de sacola - ela
varrendo o pátio de sua casa rua
nos derrames da memória - entidade
sonâmbula
santifica este meu coração primitivo
e lá narre tudo que for
inconstante
o granizo das horas - o
último orvalho de cada florzinha
minha mania de socorro onírico
as ambulâncias do firmamento
aqui são outras
repito - nada se sabe sobre
sua morte
os linguarudos da invenção cogitam
que foi numa primavera
em inércia de domingo - pouco
se tem
é certo que os vagalumes
ficaram nervosos
que a lua fugiu da terra com
seu passaporte inválido
repenso a paz de sua partida
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